ENTREVISTA ESPECIAL

Estudo analisa os efeitos e a viabilidade do policiamento de proximidade no Maranhão

O tema, hoje, é uma das principais discussões no âmbito da Segurança Pública.
Por: PORTAL JG
Data de publicação: 18/01/2020 15h58

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Andreynna Beatriz, autora do texto. Na foto: amigos

O artigo "Policiamento de Proximidade: fronteira entre criminalização e Direitos Humanos", escrito por Andreynna Beatriz Pereira Rodrigues, participante do Núcleo de Estudo em Direito e Municipalidades (NEMUD/CEUMA), com orientação do professor-doutor Márcio Aleandro Correia Teixeira, preconiza um olhar atento para a composição das estruturas institucionais da polícia, e a sua conseguinte relação com a sociedade organizada; não sem antes agregar às suas nuances o zelo aos Direitos Humanos e às garantias, individuais e sociais, guarnecidas pela Carta Constitucional.

A autora pontua, minuciosamente, os caminhos sob os quais a polícia, enquanto força de Estado, torna-se legítima. No processo de definição dos conceitos abordados, o Policiamento Comunitário é apresentado como contraponto às medidas policiais enérgicas, com apelo à autoridade e à violência. 

Sob esta composição, o Policiamento de Comunidade é encampado pelo ajuste entre a sociedade e o Estado, por meio de seus dispositivos, na formação de consensos. O processo originário do termo data dos primórdios do século XX, entre os anos de 1914 a 1919, nos Estados Unidos. Tempos depois, o tema ganhou força no debate internacional especializado, suscitando questões importantes no desenvolvimento de novas práticas na seara da Segurança Pública.

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Andreynna Beatriz apresenta dados para comunidade (Foto: Arquivo Pessoal)

A premissa do Policiamento Comunitário consiste na boa relação entre a comunidade e a Polícia, porquanto seja substrato deste convívio a prevenção de crimes, bem como uma mudança de postura nas abordagens policiais, com recusa à métodos opressivos. No Brasil, cujos instrumentos institucionais de Segurança Pública estiveram, por muito tempo, vinculados à práticas repressivas, normalizadas pela ausência de princípios democráticos sólidos, parte considerável da sociedade - ao largo, marginalizada em termos socioeconômicos -, habituou-se a agir defensivamente, com desconfiança.

O crescimento desproporcional dos grandes centros urbanos, desacompanhado de políticas sociais que dessem cabo deste fenômeno, resultaram em zonas periféricas vulneráveis, sem condições adequadas de saneamento básico e habitação. A presença reduzida do Estado na periferia e o urgido silente de cidadãos entre o perigo e o medo, resultou no distanciamento entre Polícia e população, o que gerou, por vezes, graves conflitos, sobretudo após a consolidação de grupos violentos junto ao tráfico.

Em uma entrevista concedida exclusivamente ao Portal JG, a autora do artigo, Andreynna Beatriz Pereira Rodrigues, discorre sobre pontos essenciais de seu estudo. Entre os assuntos, a pesquisadora analisa medidas implementadas no Brasil, como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP's) no Rio de Janeiro, e as Unidades de Policiamento Comunitário, no bairro do coroadinho, em São Luís.

ENTREVISTA:

Portal JG - Quais as razões pelas quais a autora desenvolveu o artigo nesta temática?

Andreynna Beatriz - Sempre quis ser pesquisadora. Assim que saiu o edital para ingresso, fiz a prova e consegui passar. Tive a honra de conseguir entrar no NEMUD/Ceuma- (Núcleo de Estudo em Direito e Municipalidades) juntamente com mais dois orientandos. Tivemos o privilégio de termos como orientador o professor-doutor Márcio Aleandro Correia Teixeira, e, a partir de então, ele nos apresentou o tema. Particularmente, me apaixonei pela questão.

Portal JG - O Policiamento de Proximidade aplica-se em amparo com os Direitos Humanos e os Direitos Fundamentais. Você considera necessária uma mudança no ambiente jurídico brasileiro para um melhor aprimoramento das políticas de Segurança Pública no país? Quais as intervenções, na sua opinião, parecem mais adequadas?

Andreynna Beatriz - Não somente e necessariamente no âmbito jurídico, mas sim um aprimoramento no sistema como um todo, seja jurídico-político, seja social. Sabe-se que as grandes motivações políticas fazem enorme diferença, principalmente quando se trata de práticas que necessitam de grandes investimentos, como é o caso da Segurança Pública. Dito isso, acredito que o real engajamento político seria um grande passo, à exemplos temos a criação do SUSP (Sistema Único de Segurança Pública), que apresenta um excelente plano estratégico

Mas, sem tal apoio, não conseguimos, de fato, sair da zona teórica, do papel. Assim, a intervenção mais adequada para o atual cenário sociopolítico seria o comprometimento com esse projeto, fazendo jus à uma política de Estado, já que estamos falando de um sistema com resultados de médio a longo prazo, que requer longo investimento.

Portal JG - Considerando o percurso histórico de repressão no Brasil, cujos instrumentos democráticos esteviveram oscilando conjuntamente à períodos de exceção, a autora percebe certa influência destes processos na atuação dos dispositivos de Segurança Pública que a sociedade brasileira dispõe?

Andreynna Beatriz - Os dispositivos de Segurança Pública, assim como diversas posições sociais, e até mesmo culturais, vem paulatinamente sofrendo mudanças ao longo do tempo, principalmente após a Constituição Federal de 1988. Então, não podemos acreditar que a instituição policial, que exerce o poder de repressão, por exemplo, se dissociou integralmente daquele sistema autoritário dos primórdios.

Creio que não há como romper absolutamente com as "raízes históricas" e ainda mais quando se pensa em mais de 20 anos de Regime Militar. O progresso, no entanto, continua. Na década de 1990, por exemplo, já se falava em Policiamento de Proximidade. Estamos em 2020, e o tema continua sendo o centro de grandes debates.

Portal JG - Como a autora avalia a experiência de políticas públicas na seara da segurança, ancoradas no entendimento de Justiça Restaurativas, à exemplo das Unidades de Polícia Pacificadora, no Rio de Janeiro?

Andreynna Beatriz - O incremento de Políticas Públicas em todo e qualquer contexto, tem um peso muito importante para a contribuição de melhorias. A Justiça Restaurativa é um olhar louvável frente aos índices alarmantes da criminalidade brasileira. Sobre as Unidades Pacificadoras do Rio de Janeiro, percebi a dualidade de pensamentos sobre os resultados indicadores.

Alguns críticos apostam na total ineficácia, vislumbrando principalmente a corrupção de determinados agentes oficiais. Outros, como eu, são otimistas e atentam a um resultado a longo prazo, mas que precisa de aprimoramento. Não podemos esquecer que a experiência da Polícia Pacificadora do Rio foi um incentivo para a implementação em nossa São Luís. Lembrando que o Policiamento de Proximidade, tema central do meu artigo, tem muitos sinônimos: Polícia cidadã, Policiamento Comunitário, Polícia Pacificadora, etc.

Portal JG - Como o Brasil poderia aprender com experiências de sucesso no policiamento, como o Sistema Koban, no qual os resultados, em solo japonês, são referência até hoje?

Andreynna Beatriz - O Sistema Koban é um referencial exemplar. Como cidadã, idealizo a prática real do Sistema Koban,no Brasil, seria a realização de um sonho [...] acredito que não podemos esquecer que é preciso começar das raízes, e a raiz de um país é a educação. A educação necessita ser prioridade no Brasil. Esse é um grande ensinamento que o Japão nos repassa.

Portal JG - Como você analisa uma mudança de estrutura no sistema prisional em paralelo com novos modelos de policiamento?

Andreynna Beatriz - A estrutura do sistema prisional brasileiro é um assunto pertinente, e precisamos de mudanças urgentes. Esse tema gera vários pontos de vista, principalmente por se tratar de um assunto polêmico.

Estamos diante de duas vertentes: punição x ressocialização. Penso que esse novo olhar sobre a instituição policial nos possibilita uma maior aplicação dos Direitos Humanos, já que estamos tratando de uma polícia próxima do cidadão, preventiva e com novos métodos.

Constantemente encarceramos pequenos delitos, contrariando veementemente o que dispõe nossa atual Carta Magna (Constituição Federal), e a maioria das conduções são representadas com homens, negros, pobres e periféricos. Há quem diga que não, mas os dados são gritantes. A bandeira do sistema sexista, racista e desigual deve ser lembrada sempre.

Portal JG - A experiência do policiamento comunitário, no bairro do Coroadinho, elucida um caminho a ser seguido em todo o Maranhão? Na sua avaliação, hoje, qual o maior obstáculo para a implementação de modelos similares às Unidades de Segurança Comunitária?

Andreynna Beatriz - Sim, os dados estão aí comprovando a eficácia, qualidade e desempenho de toda a equipe. Considero que o maior obstáculo para esse tipo de policiamento são os resultados, com duração de médio a longo prazo.

Como mencionado nos primórdios do questionário, nós, brasileiros, não estamos acostumados com esse tipo de política. Queremos resultados para ontem. Necessitamos urgentemente de um aprimoramento das ferramentas inteligentes de intervenção. Sem falar na ausência de condições mínimas de dignidade, saneamento básico, que as comunidades enfrentam.





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