PANDEMIA

Bolsonaro veta repasse de R$ 8,6 bi para estados e municípios combaterem coronavírus

Congresso e representantes regionais articulam derrubada de veto e relator chama presidente de irresponsável.
Por: FOLHA DE SÃO PAULO
Data de publicação: 03/06/2020 18h36

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O presidente Jair Bolsonaro vetou nesta quarta-feira (3) o repasse de R$ 8,6 bilhões para governadores e prefeitos combaterem a Covid-19, causando reações de parlamentares e de representantes estaduais e municipais. O dinheiro estava em um fundo gerido pelo Banco Central e que foi extinto por uma MP (Medida Provisória).

O fim do fundo foi pedido pela equipe do ministro Paulo Guedes, que queria usar os recursos para reduzir a dívida pública. No entanto, o Congresso resolveu mudar o destino do dinheiro para o enfrentamento da pandemia.

O governo afirma no Diário Oficial da União desta quarta-feira (3) que a proposta dos parlamentares diverge do ato original, o que violaria os princípios da reserva legal e do poder geral de emenda.

Afirma também que o ato criaria uma despesa obrigatória sem previsões de impacto nos próximos anos, o que também defende ser irregular. O veto foi defendido pelo Ministério da Economia e pela Advocacia-Geral da União.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que o veto surpreendeu deputados.

“A informação dos deputados é que tinha ocorrido um acordo [com o governo], inclusive, para destinação desses recursos”, afirmou Maia nesta quarta.

Agora, segundo ele, cabe ao Congresso convocar uma sessão para analisar o ato de Bolsonaro e decidir se o veto será mantido ou derrubado. Líderes partidários já articulam uma derrota do governo.

Durante as votações da Câmara, nesta quarta, Maia foi cobrado para que articule junto com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), a convocação da sessão do Congresso para analisar vetos presidenciais.

O relator da MP na Câmara, Luis Miranda (DEM-DF), disse que a proposta tinha sido costurada em parceria com o governo e aprovada de forma unânime. “Foi extremamente surpreendente. Ele traiu um acordo que fizemos com líderes do governo nas duas Casas”, afirmou.

“Ele [Bolsonaro] é irresponsável, é totalmente descabido tomar uma decisão dessa, além de ser um desrespeito ao Congresso”, afirmou. “Ele não visita hospitais com doentes, mas vai de helicóptero para lanchonete, como se fosse barato. O descaso dele com o momento que estamos vivendo é grande”, afirma.

Para ele, o texto sancionado também pode deixar a destinação dos recursos do fundo em um limbo jurídico por não dizer mais expressamente que o valor em questão vai para o pagamento de dívida.

Caso os recursos ainda não tenham ido para a dívida e continuem disponível na Conta Única, assessores parlamentares dizem que fica criada uma situação que precisaria de estudo jurídico.

Consultado, o Ministério da Economia não se pronunciou até o momento.

Rafael Fonteles, presidente do Comsefaz (Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal), afirmou que os estados vão articular com as bancadas a derrubada do veto.

O secretário executivo da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), Gilberto Perre, afirmou que a entidade foi surpreendida, inclusive, porque teve reunião no mês passado com o Ministério da Saúde para discutir um passo além ao da proposta, o formato de divisão dos recursos. “Vamos trabalhar para derrubar o veto”, disse.

Para o governo, a medida tinha caráter de urgência por permitir o uso dos R$ 8,6 bilhões disponíveis para abater a dívida. Isso ajudaria, inclusive, o cumprimento da regra de ouro (que tem como objetivo proibir endividamento para pagamento de despesas correntes, como salários e aposentadorias).

O Congresso alterou a medida para que os recursos existentes fossem transferidos integralmente a estados, Distrito Federal e municípios. O valor deveria ser usado para a aquisição de materiais de prevenção à propagação do coronavírus, para proporcionar condições de abertura de estabelecimentos comerciais.

O fundo extinto pela MP é administrado pelo BC e recebia recursos do IOF para ser usado na intervenção nos mercados de câmbio e títulos, além da assistência a bancos (conforme previsto em uma lei de 1966).

O fundo era visto como irregular pelo TCU (Tribunal de Contas da União) porque estava sem objetivo e sem prestar serviço à sociedade após ter seu uso restrito com mudanças legais ao longo dos anos. O próprio órgão determinou ao governo uma solução definitiva para o problema.

Na década de 1980, por exemplo, o fundo deixou de receber recursos. Em 2000, com a Lei de Responsabilidade Fiscal, ficou vedado o socorro público a instituições financeiras e os recursos dele deixaram de ser usados para esse objetivo.

“Não há porque a administração pública dar continuidade ao exercício das atividades relacionadas à administração do fundo, incorrendo em custos sem qualquer benefício que compense tais custos”, afirmou o governo na exposição de motivos da MP, em dezembro.

Esse é mais um veto que contraria representantes estaduais em menos de um mês. Em maio, Bolsonaro decidiu barrar trecho de projeto de lei que impedia a União de executar garantias dos entes em caso de não pagamento de dívidas deles a bancos internacionais.

Máscaras nas periferias

Mesmo com quarentena, aglomeração em feiras prosseguiu e muitos não utilizam máscaras para comprar alimentosTransporte público cheio em GuaianasesNas periferias de São Paulo, uso de máscaras aumentou desde decreto.

Durante as discussões, Bolsonaro se reuniu com chefes dos Executivos estaduais e o governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), pediu que o trecho não fosse vetado. Para os governadores, isso inviabilizaria a suspensão do pagamento das dívidas com organismos multilaterais, que traria um alívio de R$ 10,7 bilhões.

Ao vetar, o presidente escreveu que "o dispositivo, ao impedir a União de executar as garantias e contragarantias das dívidas a que se refere, viola o interesse público ao abrir a possibilidade de a República Federativa do Brasil ser considerada inadimplente perante o mercado doméstico e internacional".





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